O Bobo da Corte
Eu era o cara cuja única obrigação era fazer qualquer coisa para tirar alguns risos dos membros da corte. Por mais que eu achasse a maioria das coisas que fazia (senão todas) estúpidas, continuava lá, fazendo tudo o que eu achava mais banal e idiota apenas para ser um bom bobo. E como eu era bom em ser bobo!
Enquanto eu inventava alguma gracinha nova, a realeza ficava se divertindo e quem sabe pensando: “Como esse cara pode ser tão ridículo a ponto de pensar que isto é engraçado, é mesmo um bobo”. Mas eles gostavam daquilo. Quem sabe não pela minha atuação como bobo da corte, pelas piadinhas ou pelas quedas, mas quem sabe pela minha ingenuidade. E eu continuava lá, fazendo graça e pensando em como poderiam ser tão otários a ponto de se divertir com coisas como aquelas. Eu tinha mesmo é que ser um bobo!
Mas aprendi algumas lições. Não sou mais tão ingênuo.
Você quer ser o bobo da corte?
Depois de me aposentar como bobo e descer as ladeiras do castelo rumo à plebe, comecei a perceber que o que eu fazia era completamente aceitável e normal. Agora começo a ver bobos da corte por todos os lados, em todos os lugares. Eles estão no Brasil, estão em todo o mundo. São os bobos da corte modernos!
Pessoas escravizadas pelos seus chefes, pelos seus professores, pelo dinheiro... São, na verdade piores que bobos, pois pelo menos eu tinha a liberdade de inovar, de inventar, desde que agradasse. Mas esses bobos modernos são piores que eu poderia imaginar: são como máquinas programadas para realizar as tarefas de sua vidinha diária. Sempre as mesmas. Acordar, trabalhar, voltar pra casa cansado e dormir. Cegos, surdos e mudos. Cegos e surdos por não conseguirem perceber que a vida lhes foge na velocidade de seus passos apressados. Mudos por serem incapazes de pensar, levantar, gritar, lutar. Foram vencidos pela descrença, pela comodidade, pelo “ter tudo sob controle”.
Enquanto isso, a corte ri feliz! Seus milhões e milhões de bobos modernos estão todos presos em suas próprias celas, em suas próprias crenças. Presos por sua própria vontade! É quase como se, no fundo, todos vivessem sob o controle da matrix. Vocês são mesmo uns bobos. Vivem no ridículo de fazer tudo para poderem agradar a realeza e ainda acham que estão no controle de suas vidas. Sem saber que, façam o que fizerem, estarão sempre vivendo a mesma vida do mesmo modo: correndo pra lá e pra cá, trabalhando de sol a sol. Enquanto isso a corte lhes suga toda energia, como as máquinas da matrix. E ainda acham graça dos pobres bobos, sempre dispostos a se doar para agradar.
E aí, quer ser o bobo da corte?
Eu não quero. Mas vou ficar por aqui, por enquanto, pagando de bobo. Quem sabe eles não percebam que sou uma falha no sistema. Então ficarei com meu papel de bobo até que possa lutar, até que encontre armas e soldados. Até conseguir me libertar. Pois apesar de saber que continuo sendo um grande bobo, ainda não descobri como deixar de sê-lo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário